terça-feira, dezembro 06, 2005

John

"Tal como a sombra, o amor corre de quem o segue; foge, se o perseguis; se fugis, vos persegue"
Shakespeare

A noite de oito de dezembro de 1980 já estava terminando e eu estava com a cara metida nos livros. Eu estudava na PUC e teria prova na Cultura Inglesa na tarde do dia seguinte. Na tarde daquele mesmo dia, eu havia perdido a minha vó Marina, mãe do meu pai e estava meio pra baixo. Enquanto estudava, ouvia a Rádio Cidade, que desde que havia entrado no ar, em maio de 1977, era a mais badalada do Rio.
Por volta de uma e pouca, eu já estava pensando em ir dormir, quando o Ivan Romero, da Cidade, interrompeu a programação todo assustado. “Olha gente, acabamos de receber a notícia lá de Nova Iorque, parece que John Lennon foi assassinado.”
Naquele momento, eu e milhares de outros fizemos a mesma cara de espanto-dor-surpresa-e-dúvida: “O quê?! Mas como é possível?”
Lennon havia voltado a gravar naquele ano, após um silêncio de quase cinco anos. Depois de uma longa briga com o governo americano pelo visto permanente que lhe daria o direito de viver em paz em Nova Iorque, Lennon havia conseguido o seu green card em 1976. Estranhamente, foi aí que ele desapareceu. Fugia dos fotógrafos, não dava entrevistas, não era visto em lugar nenhum e não queria saber de música.
Assim que o ano de 1980 começou, surgiram boatos de que ele estava procurando um estúdio para gravar um novo álbum. O segredo foi desvendado em uma entrevista à revista Esquire. Em seguida, uma revista de fofocas norte-americana publicou que Lennon estaria precisando de dinheiro, por isso estaria disposto a voltar. Era tudo mentira. E para provar isto, ele doou 1 milhão de dólares para que a polícia nova iorquina comprasse armamentos e equipamentos de defesa – em fevereiro daquele ano, a morte de um policial a golpes de karatê, numa etação do metrô, havia comovido a cidade.
Em março, John começou a gravar o álbum Double Fantasy. Estava ansioso e preocupado. Aos amigos íntimos, ele confidenciava que tinha medo de não ter mais a mesma popularidade, após tantos anos de afastamento.
Mas quando foi lançado, em setembro, o álbum foi direto para o primeiro lugar das paradas. Animado, Lennon deu entrevistas sorridente e anunciou que havia composto tantas músicas nos anos de jejum, que daria para fazer um outro disco.
E ele não estava brincando. Naquela noite de oito de dezembro, John havia terminado a mixagem da última música do que seria o Doublé Fantasy II. A famosa fotógrafa Ann Leibovitz, da revista Rolling Stone, foi tirar a foto para a capa do álbum – que seria a última do ex-beatle – e houve uma pequena festinha no estúdio para comemorar os fins dos trabalhos. A equipe ainda queria esticar em algum lugar da cidade que nunca dorme. Mas Lennon preferiu ir para casa com Yoko, pois estava muito cansado e estava frio demais.
A temperatura estava próxima a zero grau quando o casal chegou na porta do sinistro edifício Dakota, em frente ao Central Park. Havia um rapaz parado na calçada. Parecia ser um fã. Lennon deve ter pensado que só um louco ficaria ali, àquela hora, com aquele frio, à espera de um autografo. Tinha razão. David Chapman, 25 anos, desempregado, ex-guarda de segurança em Honolulu, era realmente louco. Não fugiu após atirar em Lennon. Apenas largou a arma e a polícia o encontrou sorrindo ao lado do corpo. "Ele me deu um autógrafo com má vontade.", foi sua explicação pelo o que havia acabado de fazer.
Logo depois, o Ivan Romero voltou com informações confusas. Falavam em tentativa de assalto, briga, crime encomendado. Yoko, em estado de choque. Inicialmente, Lennon teria morrido na hora. Depois, não, foi a caminho do hospital. Mas a verdade foi que a morte se deu quando recebia atendimento. No dia seguinte, a foto do chefe do plantão dando a notícia para o batalhão de repórteres, rodou o mundo, enquanto fãs se suicidavam em várias partes. Ringo Star foi o único beatle a ir a Nova Iorque. Não houve velório e nenhuma cerimônia pomposa. A missa de sétimo dia foi realizada ao ar livre, no Central Park. Homenagens semelhantes ocorreram em vários países. Aqui no Rio, houve um pequeno culto no Jardim de Alah. E só.
Enfim, John estava morto. “Mas como é possível?”
Vinte e cinco anos depois, continuo sem resposta.
E enquanto espero, morro de saudade.

Pelo amor de Deus!
Não se mate!
A segunda edição do A Arte de Odiar já vai sair.

8 Comments:

Anonymous Anônimo said...

manda bala. grande título, A Arte de Odiar é muito bom!

quarta-feira, dezembro 07, 2005 10:23:00 PM  
Blogger Julio Cesar Corrêa said...

Valeu, grande Wiskow
vc leva bala aqui e daqui a pouco eu vou lá levar uma dentada
gd ab

quarta-feira, dezembro 07, 2005 10:27:00 PM  
Blogger Jôka P. said...

The dream is over.
:(

quarta-feira, dezembro 07, 2005 11:14:00 PM  
Blogger Julio Cesar Corrêa said...

Unfortunately, dear Jôka
gd ab

quinta-feira, dezembro 08, 2005 7:21:00 AM  
Anonymous Anônimo said...

Pois é, Julio Cesar,
Fatos como esse, sem explicação e cobertos de uma estúpida violência, não conseguem ser esquecidos
25 anos, parece que foi ontem. Nem havia me dado conta de que fora em 1980.
Puta perda!Irreparável.
Abração
fernando cals

quinta-feira, dezembro 08, 2005 11:11:00 PM  
Blogger Julio Cesar Corrêa said...

Pois é, Fernando. Me sinto órfão de John. O que me chocou não foi só a perda, mas tb a circustância em que aconteceu.
gd ab

sexta-feira, dezembro 09, 2005 7:42:00 AM  
Blogger Jôka P. said...

Julio,
obrigado por suas palavras de apoio.
Eu já estou melhor e logologo estarei legal.
Lembra de legal paca ?
Estarei assim.
Legal paca.
(nunca entendi esse "paca"...)
Não há nada que o tempo e umas boas doses de Feldene não cure.
Um abraço,
Jôka P.
:)

sábado, dezembro 10, 2005 12:38:00 AM  
Blogger Luma Rosa said...

A sensação de perda de um ídolo deve ser terrível!
Excelente fim de semana! Beijus

sábado, dezembro 10, 2005 12:59:00 AM  

Postar um comentário

<< Home